sexta-feira, novembro 03, 2006

Sonhos maus, sonhos meus

Contorço-me, sinto o meu corpo estremecer e ao mesmo tempo, encolher. É uma sensação angustiante, desgastante, estou em luta. Dies irae... São vários os inimigos, é só um o objectivo: sobreviver. Como? Acordando... Mudo de posição na cama, várias vezes. Nenhuma parece cómoda, aliás, não estou numa cama, mas sim num campo de batalha. Que bizarro... Somos muitos, na mesma cama, no mesmo campo de batalha. E o objectivo, afinal, não é somente sobreviver, mas sim, conquistar o campo de batalha, a cama. Sê resiliente... Os lençóis, definem os limites do campo de batalha, da área a defender ou a ocupar. Quero ambos os lados do território. Vou pôr-me na pele do inimigo, quero esfregar-me so seu pêlo. Neste misto de sensações, há também excitação, um desejo de conhecer o conhecido inimigo, o familiar perigo.
As almofadas, são pontos estratégicos, torres de vigia. Os nós dos lençóis, são pequenas armadilhas, subtis. Mas, se tivermos alguma argúcia mental, podem ser transformados em bunkers. Ocupamos esses locais e, bum, o inesperado acontece. Que genial, diriam alguns. No entanto, a famosa técnica do quadrado (pensava implementá-la), poderá falhar. A cama, aliás, o campo de batalha, é rectangular. O círculo fecha-se, o meu corpo encerra-se sobre mim. A minha cara encolhe, sinto a pele colada aos ossos do meu rosto, não tenho mais ressoadores, não há espaço dentro da minha boca, para criar sons, emiti-los e fazer com que ecoem até ao canto mais seguro. Os meus pés, estão frios. Necessito que estejam quentes e a única alternativa é roçá-los com força nos lençóis, correndo o risco de ir longe de mais e sair do campo de batalha a meio, sem dar luta. Mas, contudo, num só movimento, posso fazer com que não perca os sentidos, o meu juízo: manter-me-á alerta.
Ainda não posso acordar. Sinto os passos deles, delas, de todos. Rastejam, também. Preciso de encontrar um ponto de concentração, um foco. Lembrei-me! As almofadas! É isso! Viro a almofada, sinto o outro lado, está mais frio, fico mais desperta. As ideias começam a voltar. Arranjo o pijama, pois mesmo em campo de batalha, em tempo de guerra, a farda tem que estar sempre impecável. Aprendi isso muito cedo. É de fanela, a farda. Isso pode ajudar. Tornando-se demasiado quente, faz-me suar e com o frio da almofada, em conjunto, sentirei arrepios. Mais um impulso, uma pequena réplica de um choque eléctrico. Dou mais um nó às calças, ajusto a parte de cima, mas, algo me diz que, talvez seja melhor tirar uma das duas partes. Parecem muito simples, os nobres ensinamentos de postura correcta, asseio, decência, rectidão, mas nada como dar mesmo o corpo ao manifesto, sentindo na pele tudo o que se passa à volta. Removo a farda, não tenho tempo de a dobrar, fica a um canto. Não a posso perder, contém provas da minha luta e resolvo seguir, pelada. E a cara? Vais deixar que continue contorcida? Pensa, soldado. Um disfarce, umas pinturas de guerra, qualquer coisa... A solução encontrada, uma solução aquosa e, por vezes, salina, limpída, transparente e sai de dentro de mim. Escorre pela minha face, ninguém percebe como é que consegui introduzir tal elemento sem ninguém se aperceber e, sem eles darem conta, o campo de batalha está inundado e eu, aproveito um ponto estratégico e nele flutuo. Agora percebo porquê... Tanta gente dorme rodeada de almofadas. Uma só não chega. Duas ou mais, podem ser a nossa salvação. Estando já em porto seguro, no lado oposto do campo de batalha, da minha cama, encontro outra almofada. Toco nela. Está gelada. Sinto um tremor, sinto um espasmo no meu diafragma, aspiro o ar sofregamente, algo passa pela glote. Soluço... Acordo, estou viva. Era mais um sonho, era mais uma noite, era mais uma batalha, era mais um dia. A guerra, irá continuar. A peleja, está ganha. O, Lacrimosa...

De Profundis, ainda não chegou a tua vez. Inspiro mais uma vez. E outra...

6 Comments:

Blogger iC said...

ui...

7:29 da tarde  
Blogger Tokitoka said...

Ui? O que é que isso quer dizer?!

:-)

7:35 da tarde  
Blogger Tokitoka said...

Gaja, isto é literário. Não deixa de ser uma descrição de uma das mil e uma noites que vivemos, em que cada um de nós, tem, teve ou terá uma destas. Não uso pijamas de flanela! Mas sim, luto,por vezes, para acordar. Tenho sonhos maus, pesadelos. Mas desde que a realidade seja outra,um sonho não deixa de ser um sonho. Quando tornado real, é pelo sonhador. E a expressão, dormir sobre o assunto, é factual, é científica. Nós resolvemos questões, situações, durante o sono. Por isso, é muito importante, quando estamos a ter um sonho mau, resolvê-lo antes de acordar. Como vemos, por vezes, nos filmes. Acredita que melhora, depois de enfrentar, durante o sonho. Também é verdade que ambas as partes, sonho e realidade, estão ligadas. Mas compete-nos a nós, saber qual é que deve estar primeiro e ter mais poder, mais controlo sobre a nossa vida, sobre o nosso eu.

7:41 da tarde  
Blogger Tokitoka said...

"Prontos, vou pôr umas aspas..."

7:43 da tarde  
Blogger iC said...

o meu "ui" foi um arrepio. Foi a forma mais verdadeira que encontrei para explicar o que senti... desculpa se não é um texto longo. mas, por vezes, existem coisas que são impossiveis de descrever. o "ui" é genuino! :)

5:44 da manhã  
Blogger Tokitoka said...

sei que foi genuíno. Só queria saber se era um "ui" de - ui, que horror!

:-)beijos, vou para a figueira da foz. See you soon

p.s - textos longos...para quê? O ser verdadeiro é que conta. E não estou à espera de nenhuma validação. É assim e "mai nada". É uma partilha. Ui, estou atrasada! Este é muito genuíno! Tchau, gira!

8:45 da manhã  

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